O Piso Nacional do Magistério e os desafios dos trabalhadores em Educação para 2020
Por Edson Tenório
No dia 27 de dezembro de 2019, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) lançou uma Nota Pública informando que, a partir de janeiro de 2020, o Piso Nacional do Magistério deverá ser reajustado para R$ 2.886,15. Esse valor é referente ao salário de um profissional em início de carreira, com formação de nível médio (Normal Médio) e com carga horária de 40h/a semanais.
Esse reajuste diz respeito à atualização do valor mínimo de investimento por aluno do ensino fundamental urbano através do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais do Magistério (FUNDEB). Desde 2010, o reajuste do Piso Nacional do Magistério baseia-se no percentual de crescimento do FUNDEB de dois anos anteriores. Para 2020, esse reajuste terá como base o crescimento dos valores estimados nos anos de 2018 (R$ 3.048,73) e 2019 (R$ 3.440,29), totalizando um percentual de 12,84%.
Portanto, esse é o percentual que deve ser levado em consideração para o reajuste dos salários dos trabalhadores em educação das redes públicas de ensino. Em sua nota, a CNTE lembra ainda que o reajuste é autoaplicável e que o MEC tem feito o anúncio oficial ano a ano com o intuito de orientar os entes estaduais e municipais. Afirma também esperar que o Ministério mantenha a postura de coordenação da política pública de valorização do magistério.
Ocorre que, logo após a manifestação da CNTE, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) publicou, em 30 de dezembro, uma “Nota sobre os impactos do reajuste do Piso Nacional do Magistério para 2020”. Nesse documento, reconhece a necessidade de valorização dos profissionais do magistério que, segundo a nota, são “fundamentais para o desenvolvimento do País”. Mas, contraditoriamente, argumenta que a aplicação da Lei do Piso gera “graves impactos à gestão da educação e às finanças municipais”.
Para tanto, apresenta um quadro comparativo entre a evolução do Piso Nacional do Magistério, o INPC e o reajuste do salário-mínimo desde 2009. Nessa comparação, porém, não aparece a evolução salarial de outras carreiras profissionais, sobretudo carreiras de nível superior. Além disso, desconsidera, por exemplo, o fato de os salários vinculados à educação ainda serem os menores comparados com outras carreiras de Estado. A nota também apresenta um conjunto de dados e percentuais genéricos e tenta vincular o reajuste do Piso ao não cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). No entanto, ignora, entre outras coisas, a complementação da União para estados e municípios que não conseguem pagar o Piso. Com base nesses números, a CNM solicita a revisão dos dados do FUNDEB e propõe alterar o critério de reajuste anual do Piso Nacional do Magistério.
O que os municípios estão defendendo é um reajuste baseado no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que no acumulado dos últimos 12 meses somou 3,37%. Na prática, essa posição, abonada por alguns governadores, representa o desmantelamento da política nacional de valorização do magistério. Essa posição, somada à imposição de teto aos investimentos públicos nas áreas sociais e à proposta de flexibilização da regra constitucional que impõe o investimento em educação de pelo menos 25% do total das despesas municipais, evidencia um processo de sucateamento da Educação Pública.
Diante do exposto, é possível prever que entre as batalhas que serão travadas em 2020, a defesa da Lei do Piso e a garantia da sua implementação com rebatimento para toda a carreira se apresenta com um enorme potencial de mobilização da categoria. Esta luta, portanto, deve estar vinculada ao cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação, sobretudo o cumprimento da Meta 18, que prevê a implementação e/ou adequação dos planos de cargos e carreiras com referência no Piso Nacional do Magistério. Além disso, a garantia do reajuste de 12,84% deve estar articulada, por exemplo, com a luta pela aprovação do FUNDEB Permanente. A extinção do Fundo pode levar ao colapso toda a educação básica do país. Mas, não é suficiente apenas garantir a manutenção do FUNDEB, é necessário também garantir o aumento do percentual de complementação da União.
Para além das questões econômicas e de financiamento, os trabalhadores em educação também devem estar atentos aos ataques ideológicos à educação e ao que ela representa do ponto de vista civilizacional.
A implementação das escolas cívico-militares, por exemplo, é um desafio à parte para os profissionais do ensino esse ano. A rede municipal de Olinda foi uma das que aderiu a esse modelo. No entanto, até agora nada foi dito sobre como se dará a sua implementação. Não se sabe qual o nível de ingerência administrativo-pedagógica dos militares nessas escolas. Do mesmo modo que não está claro o tipo de relação que esses “policiais” terão com os estudantes, os educadores e suas práticas pedagógicas. Também não se sabe quais relações de hierarquia serão impostas. Assim como ainda é obscuro o destino dos recursos que serão dispensados para o programa. Mas ao que tudo indica, esses recursos serão destinados exclusivamente ao pagamento de militares da reserva que se dispuserem a atuar nessas escolas.
Uma coisa é certa: a escola que aderir a esse programa, em nome de uma disciplina salvadora, estará automaticamente abrindo mão da sua autonomia pedagógica. Mais do que isso, os trabalhadores em educação, do dia para a noite, estarão submetidos a um regime de hierarquia propenso a todo o tipo de assédio moral. Consequentemente, terão sua liberdade de cátedra usurpada.
Enfim, os principais desafios para os trabalhadores em educação em 2020 são: combater o processo iminente de sucateamento da educação pública; defender o reajuste de 12,84% com rebatimento na carreira; lutar pela aprovação do FUNDEB Permanente com aumento dos recursos de complementação da União; combater os ataques ideológicos à educação e ao que ela representa do ponto de vista civilizacional; combater a concepção de escolas cívico-militares e os desmandos que surgirão contra os trabalhadores em educação onde forem implementadas; lutar por gestão democrática, autonomia administrativo-pedagógica e, principalmente, pela liberdade de cátedra. Resumidamente, lutar por uma educação pública, democrática, laica e com qualidade social.
por Edson Tenório,
é Historiador e Mestre em Educação, Colunista do Blog