Fracassamos
Há séculos, fazemos política da mesma forma, somos líderes de países preocupados com a próxima eleição. Para a política, a humanidade não existe, existem os eleitores, o próximo século não existe, existe 2010, as próximas gerações não existem, existem as próximas eleições. Obama, em um momento, disse que não há presidente do mundo. Ele é presidente dos EUA, e deve defender os interesses dos eleitores de seu país, preocupados em trocar de carro, aumentar o consumo, não em salvar o planeta. Nós, políticos, estamos despreparados para os problemas planetários e de longo prazo.
O presidente Lula fala aos eleitores com sensibilidade ecológica, propondo metas para a emissão de dióxido de carbono, e também aos consumidores, propondo redução no IPI dos automóveis e defendendo a exploração do petróleo do pré-sal, com o que as emissões serão ampliadas. A própria indicação da ministra Dilma como chefe da missão brasileira em Copenhague é prova de que o presidente Lula subordinou os interesses da humanidade ao calendário eleitoral brasileiro. Não porque ele queira, mas porque essa é a lógica com que trabalhamos: políticos do século 21 com a cabeça no século 19.
Nós, políticos, fracassamos. Fomos os líderes, nos últimos 200 anos, de um caminho civilizatório que conseguiu fazer o milagre do crescimento do consumo em cada país. Mas somos incompetentes e impotentes para tomar decisões que corrijam esse rumo. Não somos capazes disso porque a lógica política não permite.
Uma prova da lógica estúpida que guia nossos passos políticos é a única exceção apresentada em Copenhague pelo presidente das Ilhas Maldivas. Ele falou para a humanidade inteira, porque seu país desaparecerá se a temperatura subir apenas 2 graus, elevando o nível do mar e cobrindo as pequenas ilhas onde vive toda sua população. Mohamed Nasheed falou para a humanidade porque este é o interesse imediato e direto de seus eleitores. Foi a exceção confirmando a regra.
Por isso, Copenhague foi um fracasso do ponto de vista das decisões dos Estados em que a humanidade se divide. Mas felizmente, foi um sucesso do ponto de vista dos que não são políticos e que estavam representando ONGs, universidades, grupos de pressão. Foram esses que tiveram a ousadia de inventar a proposta de um governo mundial, sem possibilidade de função política, apenas como força moral. Com isso, desnudaram as razões de nosso fracasso: somos força política, eleitoral, mas perdemos a dimensão do humano, moral.
Este é nosso maior fracasso: a incapacidade de combinar o eleitoral local com o moral humano. Não foi a COP-15 que fracassou, foi a política, que está sem bandeiras morais, como tínhamos até recentemente, no debate econômico e social entre socialismo e capitalismo, quando falávamos para o mundo inteiro. Agora o debate é moral, entre um tipo de civilização e outro que ainda não conhecemos, e que se choca com o individualismo de cada ser humano, cada eleitor, que busca aumentar seu poder de consumo, independentemente das consequências que isso traga para as gerações futuras.
é professor da Universidade de Brasília e senador pelo PDT/DF