Construção da Barragem Serro Azul em Palmares deixará memórias da história submersas
Memórias submersas: Construção da barragem de Serro Azul, em Palmares, vai desapropriar mais de 600 moradias
Folha de PE
Parte da história de Pernambuco está desaparecendo em Palmares, na Zona da Mata Sul. As memórias da Revolução Praieira de 1840, marcada de lutas por liberdade e concessão de direitos, agora se limitam as ruínas encontradas no Engenho Verde. A principal ameaça, no entanto, vem pelas águas. A construção da barragem de Serro Azul, no distrito que leva o mesmo nome, sinaliza a inundação de uma área que supera 800 hectares. A velha casa-grande que abrigou lideranças no passado deve sucumbir pela força imediata da represa. Junto a ela, centenas de moradores e comerciantes vêm sendo obrigados a deixar para trás os laços de toda uma vida. Muitos já partiram. E aos que restam sobram lágrimas e incertezas.
O pesquisador Reinaldo Carneiro Leão, do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano (IAHGP), concentrou estudos sobre o antigo bangalô. “A sua arquitetura é constituída por elementos neoclássicos únicos. Os arcos na fachada, piso ladrilhado e os extensos terraços laterais sempre foram motivo de admiração”, explicou. Segundo ele, o projeto do século 19 foi assinado pelo engenheiro Tibúrcio Magalhães, o mesmo responsável pelo Teatro de Santa Isabel, no Recife.
Anos depois, a propriedade chegava às mãos do industrial Miguel Dias. “O imóvel já vinha sendo descaracterizado ao longo do tempo. Áreas como as escadarias, a cozinha e o porão passaram por reformas. Tudo parecia contribuir para a sua permanência, o que não se concretizou. Assistimos a uma penosa anulação das nossas raízes”, lamentou.

Casarão encontra-se em ruínas. Foto: Leo Motta/Folha de Pernambuco
Casa-grande de lembranças
As lembranças da casa do Engenho Verde, com as receitas saborosas preparadas no fogão a lenha, ainda alimentam o imaginário do presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), Leopoldo Raposo, 67 anos. Ele é trineto do antigo proprietário e, durante a infância, ouvia os bons relatos pela boca da saudosa avó. “Ela se casou na própria capela do engenho. Era um lugar que transpirava paz e tranquilidade, algo que minha mãe sempre comentava. O próprio nome Verde se referia a intensa arborização que existia ao redor”, contou.
Ele reforçou o desejo da família de que as memórias fossem preservadas. “É um assunto que sempre vem à tona quando estamos reunidos. Durante certo tempo até funcionou uma pousada na casa. Era uma forma de aproximação do público com as histórias do lugar. Com o fechamento, tudo foi sendo apagado gradativamente”, acrescentou.
O historiador José Luiz da Mota Menezes avalia que as memórias deixadas em Serro Azul seguem carentes de mais atenção. “Vimos a repetição de velhos erros, quando a chegada do progresso acaba anulando parte da história. Em visitas realizadas observamos que o lugar era bastante rico, indicando a necessidade de mais estudos”, disse. Segundo ele, o engenho pertenceu ao sogro do Capitão Pedro Veloso da Silveira, um dos líderes do movimento de caráter libertário que ocorreu em Pernambuco entre 1848 e 1850. Foi nas suas terras que nasceu o escritor Hermilo Borba Filho, considerado uma referência cultural.
Outros casos
Menezes aponta, ainda, outros registros semelhantes para a construção de grandes reservatórios no Agreste e Sertão. “Em Parnamirim, uma série de casas teve que dar lugar a barragem de Entremontes, causando grande descontentamento. Em Surubim, o mesmo aconteceu para a construção de Jucazinho. Algo maior ocorreu em Ibimirim, quando as obras do Poço da Cruz deram fim a vários povoados”, disse. Os registros históricos revelam, também, um grande extravasamento em Canhotinho, a 190 quilômetros do Recife, que arrasou municípios no Estado vizinho, Alagoas.
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